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Folha em Branco

Folha em Branco

Seg | 31.03.08

Desabafos de uma professora

Desde que me lembro ser gente, é o meu maior sonho ser professora. Quando entrei na escola primária percebi que queria ser como a Senhora Professora Maria Alice. Queria ter muitos meninos pequeninos para ensinar numa escola pequenina como aquela. Quatro anos depois fui para uma escola básica e o sonho continuava. Foi durante o meu sexto ou sétimo ano (não me recordo bem) que descobri a minha grande paixão, as letras. Decidida a ser uma escritora de livros infantis continuei a estudar. Aos 14 anos entrei para o liceu na área de humanidades. Sem chumbar um único ano consegui entrar na faculdade aos 17 anos. Estudei, fiz o meu curso para que pudesse ser professora de “meninos pequeninos”. Hoje sou professora, mas o meu sonho de criança não passava disso mesmo, um sonho. Estive dois anos sem ser colocada numa escola e para poder sustentar a minha casa dei explicações a alunos do 1º ao 12º ano. Consegui também realizar o meu sonho de escrever um livro infantil, mas ninguém o publica. Este ano tive a sorte de ser colocada numa escola secundária como professora de Português e Inglês. A turma parecia excelente e todos os alunos exemplares. Esta, pelo menos, era a minha opinião até que há três meses um aluno me agrediu por eu o ter mandado sair da sala de aula uma vez que não estava a respeitar os colegas. É também cada vez mais difícil ver o respeito que era característico da profissão que exerço. Sempre ouvi os meus pais e as pessoas da sua geração dizer que o professor era uma pessoa extremamente respeitada. Agora me questiono… é esta nova geração que é mal educada ou são os professores que ficaram demasiado permissivos a partir do 25 de Abril de 1974? Realmente já não sei o que hei-de pensar… O meu sonho de criança desmoronou-se e nada era como eu pensava que fosse. Vivo com dificuldades, sempre a mudar de casa pois não consigo encontrar uma escola que me dê emprego fixo. O meu marido, também professor, vive da mesma maneira. Por isso ainda não tivemos filhos. Como lhes poderíamos dar uma vida estável? Concluindo… tenho 33 anos, sou casada, não tenho filhos nem casa permanente, não tenho direito a ter vida própria, mas sou professora. Com muito amor à minha profissão Uma professora de Portugal

Ter | 04.03.08

Fita isoladora

Saio de casa, vou para a paragem e entro no autocarro. Ligo o meu mp3 tão alto quanto possível, numa tentativa de evitar ouvir as conversas sobre a lentidão com que os funcionários da segurança social trabalham. Antes do resumo das telenovelas vem a frase mais famosa "a juventude está perdida" ou "se aquela rapariga fosse minha filha...". Pouco depois (dependendo do trânsito) apanho o metro e saio uma estação depois (ainda é um bocadinho...) para ir para a faculdade e sempre de mp3 ligado.  Chego, entro na sala e sento-me. Converso se alguma das cinco pessoas com quem falo entrar logo a seguir. Caso contrário abro um livro ou pego numa folha em branco e dou asas à imaginação e faço um desenho (não é para me gabar, mas até tenho jeito). No fim do dia (agora é mais ao fim da tarde...não tenho aulas de manhã e saio às 17:30 no máximo) passa-se mais ou menos a mesma coisa, depois de sair do metro apanho o autocarro até casa sempre de mp3 ligado, a ler qualquer coisa ou se tal for possível a dormir (todos os dias admiro-me como é que, quando adormeço, acordo sempre um bocadito antes da minha paragem...ainda não ferrei bem...). Por vezes tenho a impressão de que tenho uma fita qualquer em meu redor que isola de algumas pessoas...a verade é que me isola da maioria das pessoas. Não tenho muitos amigos, tenho muitos conhecidos. Amigos são poucos, mas muito bons e quem está a ler isto (e me conhece) sabe muito bem que os meus amigos são aqueles que guardam os meus segredos e esses só os confiei a três pessoas (curiosamente são todos rapazes) e elas sabem quem são. Será que ter esta fita me faz bem? Talvez sim, talvez não, é um mistério, mas até hoje não tenho razões de queixa e a verdade é que mais vale um verdadeiro amigo do que dois ou três falsos verdadeiros amigos.